Eixo Biocombustíveis da Linha V investiu cerca de R$ 70 milhões em cinco anos

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Entre 2019 e 2024, o Eixo Biocombustíveis da Linha V – Biocombustíveis, Segurança e Propulsão Alternativa à Combustão, coordenado pela Fundação de Apoio à UFMG (Fundep), recebeu R$ 68 milhões em aporte e R$ 87 milhões em contrapartidas. No período, foram fomentados 28 projetos, com a participação de 30 Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs) e 36 empresas. O Programa Prioritário é parte do Mover (Mobilidade Verde e Inovação), e se dedica a duas importantes  vertentes para a evolução da indústria automotiva e sua cadeia produtiva no Brasil: eficiência energética e sustentabilidade.  

Desenvolver tecnologias e biocombustíveis que diminuam ou cessem a emissão de gases do efeito estufa (GEE) é um dos compromissos assumidos pelo governo brasileiro no Acordo de Paris. Pelo plano, até 2030, o Brasil deve reduzir em 43% as emissões de GEE, tendo como base os níveis registrados em 2005 (Contribuição Nacional Determinada – Itamaraty, 2016).  

Com o amplo uso de energia gerada a partir de usinas hidrelétricas, o desafio do país sul-americano está diretamente atrelado à mobilidade. O Brasil tem 43% de suas emissões ligadas aos transportes, contra 14% dos demais territórios. Com isso, as alternativas ao uso de combustíveis fósseis e a redução da pegada de carbono tornam-se prioridade. 

O Mover é uma política pública dedicada a incentivar o desenvolvimento de soluções para indústria automotiva brasileira e toda a sua cadeia produtiva, desde o uso de biocombustíveis em substituição dos combustíveis fósseis até o descarte de baterias de veículos elétricos, passando pela produção de componentes com dimensionamento da pegada de carbono e compensação da emissão de GEE.  

“Estamos alinhados a iniciativas nacionais recentes, como a Lei 14.993, que regulamenta e cria programas de incentivo à produção e ao uso de combustíveis sustentáveis; o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC); o Renovabio, entre outras.  O foco está em intensificar projetos para avaliar biocombustíveis e sua eficiência em motores, enfatizando o papel do Brasil na exploração de combustíveis sustentáveis”, explica a coordenadora técnica da Linha V e docente da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Mona Lisa Moura. 

A Linha V se propõe a aumentar a disponibilidade de combustíveis oriundos da biomassa para uso em motores à combustão, incluindo veículos pesados (caminhões e tratores, por exemplo), marítimos e com motores flex (que usam álcool) e híbridos. “Além de promover sinergia entre a cadeia automotiva e a academia, o Programa Prioritário atingiu as metas traçadas. O foco era a redução das emissões de poluentes, a elevação da eficiência energética e o incremento da segurança dos veículos, de forma a melhorar a qualidade do produto e torná-lo mais sustentável”, diz Mona Lisa sobre o 1º ciclo (2019-2024) do Programa Prioritário coordenado pela Fundep. 

A coordenadora técnica da Linha V acrescenta que, antes de pensar em projetos de mitigação da emissão de GEE, foi necessário conhecer a real contribuição das emissões de combustíveis fósseis pelo setor automotivo brasileiro para propor estratégias eficazes. “O projeto do ‘Berço ao portão’, por exemplo, ainda em andamento na Linha V, resultará na elaboração de uma ferramenta setorial para o cálculo da pegada de carbono, a partir da quantificação dos impactos da produção de veículos leves as e do mapeamento das principais fontes de emissões do processo, desde a extração da matéria prima até a fabricação das montadoras”, detalha Mona Lisa. 

Geração de hidrogênio embarcado 

Professor titular da FEI, Ricardo Belchior Torres

Uma das iniciativas que se destaca no eixo Biocombustíveis  é o projeto “Eficiência Energética em Motores Flex com Enriquecimento de Hidrogênio Obtido por Reforma Catalítica Embarcada”. A iniciativa é coordenada pelo professor titular do Departamento de Engenharia Química da Fundação Educacional Inaciana Padre Saboia de Medeiros (FEI), Ricardo Belchior Torres, com participação das empresas parceiras AVL e Sabó e das ICTs Instituto Nacional de Tecnologia (INT) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A pesquisa conta com aporte de R$ 3,1 milhões da Fundep e contrapartidas de R$ 2,3 milhões 

O projeto se dedica a desenvolver um catalisador monolítico de reforma do etanol para a produção de hidrogênio embarcado, além de simulação numérica em softwares e realização de ensaios em bancada dinamométrica, usando um motor monocilíndrico de pesquisa, para avaliação de desempenho e de emissão de poluentes.  

“O uso de etanol para gerar hidrogênio por meio da reforma embarcada é um caminho interessante. O etanol é um combustível verde que libera CO² quando queimado, mas o gás é recompensado pelo processo de captura pela cana de açúcar. Nós geramos hidrogênio durante o processo de combustão do etanol, injetando-o diretamente no motor”, explica Ricardo Belchior Torres.

O professor acredita que a tecnologia de mobilidade sustentável proposta pode transformar o cenário de transporte no Brasil. “Se a Europa tivesse etanol, seria a molécula do século. Atualmente, eles seguem em direção a carros elétricos, pois não possuem biocombustíveis”, disse Torres. Segundo ele, essa percepção reforça o argumento de que o Brasil pode se tornar um líder mundial na produção de etanol de cana-de-açúcar.  

Torres reconhece a importância das parcerias nos estudos. Segundo ele, um projeto dessa envergadura jamais teria acontecido sem a união entre a universidade e a indústria. Ele ressalta que a colaboração entre os dois lados foi fundamental para o desenvolvimento das ações. 

O estudo, que está na fase de desenvolvimento do catalisador monolítico, ainda não consegue dimensionar o custo da tecnologia para os fabricantes de veículos. O coordenador diz que a peça está sendo produzida para implantação em veículos já em uso, desvinculando a necessidade de renovação da frota. Dessa forma, a tecnologia fica mais acessível.   

A metodologia do projeto é: 

  • Revisão da Literatura: abordar as tecnologias existentes de produção de hidrogênio a partir de etanol, focando em reatores compactos e catalisadores eficientes; 
  • Preparação dos catalisadores: preparar catalisadores em pó, utilizando diferentes metais (nobres e não-nobres) e técnicas de síntese. A caracterização completa dos catalisadores será feita utilizando diversas técnicas (DRX, microscopia eletrônica etc.) para determinar a composição, estrutura e propriedades físico-químicas; 
  • Testes de catalisadores: testar a atividade catalítica dos catalisadores em um reator de leito fixo, simulando as condições de operação dentro do reformador embarcado. A análise dos produtos da reação será feita via cromatografia gasosa; 
  • Projeto e construção do reformador: Baseado nos resultados obtidos nos testes dos catalisadores e em simulações computacionais, projetar e construir um reformador compacto e eficiente para ser integrado ao sistema de escape do motor. Será utilizada uma unidade monolítica para otimizar a área superficial e a transferência de calor; 
  • Simulações Numéricas: simular desempenho do motor com a mistura etanol-hidrogênio usando softwares de dinâmica de fluidos computacional para otimizar as condições de operação antes dos testes experimentais; 
  • Testes experimentais: conduzir testes em um motor monocilíndrico de pesquisa (AVL SCRE), permitindo uma análise detalhada da combustão através de medições de pressão e temperatura. Serão testadas diferentes misturas de etanol e hidrogênio, comparando o desempenho com a gasolina e o etanol puro. As emissões também serão monitoradas. 

Ciência e tecnologia

Marco Fraga, pesquisador sênior do INT

Uma das ICTs participantes do projeto, o Instituto Nacional de Tecnologia (INT) apoia no desenvolvimento do catalisador e o escalonamento do produto para o tamanho real, já que os primeiros testes feitos em laboratório usaram um catalisador com tamanho reduzido.  

“A nossa parte é desenvolver esse catalisador para a produção de hidrogênio a partir do etanol. A produção é feita por meio de um reformador embarcado no veículo, que converte o biocombustível em hidrogênio via processo catalítico. Precisamos garantir que o hidrogênio seja produzido sob demanda, integrando-o ao motor para otimizar a combustão e reduzir as emissões.”, detalha Marco Fraga, pesquisador sênior do INT. Ainda segundo ele, mesmo na fase de testes o projeto já mostrou progressos consideráveis e os dados coletados ajudarão a refinar o sistema. 

Fraga ressalta a importância de um estudo dessa magnitude ser multidisciplinar. “Esse projeto demanda competências diferentes e saberes diversos para que possamos avançar no desenvolvimento tecnológico. É fundamental trazer diferentes expertises para alcançar um resultado significativo”, diz. 

Desenvolvendo o catalisador

Integrante do projeto, a empresa Sabó está diretamente ligada ao desenvolvimento do catalisador. “Entramos no projeto com horas de engenharia e metodologias de gestão, para garantir que atingiremos os objetivos traçados”, detalha Cláudio Salvático, gerente de Contas da Sabó. 

Salvático também reconhece a importância do aprendizado gerado até agora. “Durante o desenvolvimento do projeto, muitas novas ideias e conhecimento foram adquiridos. Daria para fazer mais uns dois ou três projetos a partir do que aprendemos aqui”, analisa. 

Sobre o país se tornar referência mundial em biocombustíveis, Salvático é otimista. “Acredito que o Brasil acordou para isso. Nós temos uma matriz energética limpa e barata, e o etanol é nossa principal vantagem”, afirmando que o desenvolvimento de tecnologias de hidrogênio pode fortalecer a indústria nacional e contribuir para a autonomia energética. “Trabalhamos para melhorar a eficiência energética do motor em torno de 10 a 12%. Se conseguirmos equiparar o custo por quilômetro do etanol com o da gasolina, será o que o Brasil precisa, pois a nossa frota hoje é totalmente flex”, acrescenta. 

Futuro sustentável

Mona Lisa Moura explica que, no 2º Ciclo da Linha V, o objetivo é buscar projetos que aumentem a competitividade do setor, por meio de iniciativas colaborativas e formação de grupos interdisciplinares. No Eixo Biocombustíveis, “a expectativa é intensificar estudos para a adequada avaliação dos biocombustíveis através de testes em motores à combustão e híbridos”, afirma a coordenadora técnica. 

Cláudio Salvático, gerente de Contas da Sabó

Ricardo Belchior Torres está otimista com o futuro da indústria automobilística brasileira, que, segundo ele, pode seguir pelo caminho de priorizar um combustível totalmente sustentável. “Acreditamos que a tecnologia pode ser mais eficiente que os carros elétricos, uma vez que não gera resíduos como as baterias elétricas”, enfatizando a relevância do etanol. 

O pesquisador sênior do INT, Marco Fraga, também destaca a vocação do Brasil como um país de biocombustíveis. “Temos uma longa história com o etanol. Somos pioneiros nesse segmento e acredito que devemos continuar investindo nessa área, pois a transição para combustíveis mais limpos é essencial para enfrentar o colapso climático que já estamos vivendo. Iniciativas como essa fortalecem a posição do Brasil como líder em biocombustíveis, ajudando a pavimentar o caminho para um futuro mais sustentável. E o Programa Mover é fundamental para alinhar indústria e academia, promovendo um ambiente fértil para inovação”, encerra. 

Sobre a Linha V 

A Linha V – Biocombustíveis, Segurança Veicular e Propulsão Alternativa à Combustão –, do Programa Mover, tem como diretriz a eletrificação do powertrain veicular para a alta eficiência energética, a utilização de biocombustíveis para a geração de energia e a adequação do contexto brasileiro de infraestrutura de abastecimento.   

A partir da aliança entre os principais atores que representam o conhecimento do setor (empresas, entidades representativas e Instituições de Ciência e Tecnologia – ICTs), serão habilitadas as competências necessárias para capacitar a cadeia automotiva.

A Fundep é a coordenadora da Linha V. A coordenação técnica é da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), do Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana (FEI) e da Universidade Estadual do Ceará (UECE).    

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