Inovação na mobilidade: como o Brasil está desenvolvendo seu próprio sistema de baterias para veículos leves

Categoria: Linha V

Nos últimos anos, o Brasil vem acelerando sua busca por soluções de energia limpa e mobilidade sustentável. Nesse cenário, uma iniciativa ganha destaque: o desenvolvimento de sistemas inteligentes de gerenciamento de baterias — o chamado BMS — com foco especialmente em veículos leves, como micro-ônibus e vans urbanas. 

O Battery Management System (BMS) é um componente do Battery Energy Storage System, (BESS), que é responsável por armazenar energia, por exemplo, em baterias de lítio, além de capturar a energia de diversas fontes, possibilitando assim uma distribuição de energia de forma mais eficiente e segura. Já o BMS possui diversas funções, sendo a estimativa do Estado de Carga e do Estado de Saúde da bateria as principais. Elas são fundamentais para a realização do gerenciamento energético adequado, visando o aumento da autonomia do veículo e da vida útil da bateria. 

Alain Potts, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e coordenador geral do projeto
Alain Potts, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e coordenador geral do projeto

Neste sentido, a meta principal do “Projeto e construção de um Sistema de Armazenamento de Energia associado à um BMS adaptativo para aplicação em Veículos Comerciais Leves” é criar um sistema de gerenciamento de baterias capaz de reconhecer diferentes químicas — como as de lítio ferro fosfato (LFP) e de níquel, manganês e cobalto (NMC) —, que representam o futuro do setor, especialmente na busca por maior segurança, durabilidade e custo acessível das baterias.  

Segundo Alain Potts, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e coordenador-geral da iniciativa, a ideia surgiu como resposta ao crescimento do mercado de veículos elétricos no Brasil, aliado ao desejo de nacionalizar este tipo de tecnologia.  “Nosso objetivo era criar uma solução tecnológica própria, que atendesse às condições do transporte urbano brasileiro e às particularidades do clima, da infraestrutura de recarga e das químicas de baterias disponíveis no país”, explica. 

O projeto, executado por meio de uma parceria entre diversas universidades e empresas, é uma iniciativa da Linha V – Biocombustíveis, Segurança e Propulsão Veicular, do Programa de Mobilidade Verde e Inovação (Mover), coordenada pela Fundação de Apoio da UFMG (Fundep). 

O início oficial das atividades ocorreu em 2023, e, desde então, o trabalho tem evoluído continuamente, com foco na pesquisa, desenvolvimento de algoritmos, construção de protótipos e testes em campo. Com aporte total de R$ 2,9 milhões, a expectativa é concluir as atividades em 2026. 

Como foi desenvolvido o sistema de gerenciamento de baterias

O trabalho do grupo envolveu a elaboração de algoritmos avançados que estimam o Estado de Carga (SOC) e o Estado de Saúde (SOH) das baterias, além da construção de modelos matemáticos que fazem a identificação das diferentes químicas de células. Essas informações, validadas em câmaras de testes e em protótipos, culminam na montagem de sistemas de gerenciamento que podem ser aplicados em veículos reais. 

Para conseguir essas validações, o projeto contou com a expertisse da Hion Tecnologia, especializada em soluções de armazenamento de energia. Segundo Cynthia Thamires da Silva, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da startup, o trabalho contou com uma infraestrutura de testes em laboratórios especializados, além da capacitação de profissionais nacionalmente. “Nós realizamos a montagem de células, protótipos e testes de resistência, contribuindo de forma concreta para o avanço dessa tecnologia”. 

A gerente reforça que uma das grandes inovações do sistema é sua compatibilidade com diferentes químicas de baterias, o que amplia suas aplicações. “A iniciativa traz uma oportunidade de o Brasil evoluir na cadeia de produção de baterias automotivas, reduzindo custos e aumentando o controle sobre a tecnologia,” avalia. A visão é compartilhada pelo professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e coordenador geral do projeto, Alain Potts,: “Estamos construindo uma base de conhecimento que permitirá ao país fabricar sistemas confiáveis, seguros e adaptados às nossas condições. É uma estratégia crucial para que o Brasil seja mais autônomo no setor”. 

Bruno Paterlini, gerente de Desenvolvimento de Produto na Mercedes
Bruno Paterlini, gerente de Desenvolvimento de Produto na Mercedes

Ciência em parceria com a indústria

Um fator decisivo para a evolução do projeto foi a parceria com a Mercedes-Benz do Brasil. Segundo Bruno Paterlini, gerente de Desenvolvimento de Produto na Mercedes, o envolvimento da empresa começou em 2023, com a missão de testar e validar protótipos de baterias desenvolvidos no Brasil, centrando esforços na adaptação às condições brasileiras de operação. “Nós disponibilizamos um ônibus articulado, que já estava em campo, que foi equipado com baterias e usado para montar e validar o sistema de gerenciamento”, explica. A escolha desse veículo específico foi estratégica, pois seu tamanho e complexidade permitiram realizar testes de resistência, temperatura, caracterização e durabilidade em condições reais de uso.

Paterlini reforça que “a participação da Mercedes no projeto é fundamental para garantir que as soluções sejam aplicadas de fato na indústria nacional, fortalecendo a cadeia produtiva e promovendo veículos mais eficientes, seguros e sustentáveis”.

Além disso, ele avalia que o envolvimento da fabricante no desenvolvimento de uma solução adaptável às condições brasileiras de operação torna o Brasil mais competitivo na produção de veículos elétricos leves, inclusive valorizando a cadeia de fornecimento de componentes locais. “Essa parceria é um exemplo de como a união entre indústria e academia pode acelerar o avanço tecnológico, contribuindo para a modernização do setor automotivo brasileiro e para a consolidação de uma cadeia de inovação nacional”. 

O impacto do programa Mover

Um dos principais fatores que facilitaram o andamento do projeto foi o apoio do Mover. Criado para impulsionar investimentos públicos e privados em soluções sustentáveis de mobilidade.  A Linha V –  Biocombustíveis, Segurança e Propulsão Veicular forneceu recursos, infraestrutura e mentoria técnica para acelerar o desenvolvimento das tecnologias. 

Para Ludmila Corrêa, pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora técnica da Linha V do Mover, a expectativa é que, nos próximos anos, o projeto avance na fabricação de sistemas de gerenciamento de baterias em escala industrial, além de fortalecer a cadeia de produção dos equipamentos no Brasil. “Queremos que, futuramente, essas soluções possam ser produzidas aqui de forma competitiva, gerando empregos qualificados e contribuindo para tornar o Brasil um polo de inovação tecnológica em energia para veículos leves”, afirma. 

Uma tecnologia que vai além do transporte

Embora a prioridade seja o setor de veículos leves, o desenvolvimento de sistemas de gerenciamento de baterias compatíveis com diferentes químicas tem potencial de aplicação em diversas áreas de energia renovável e armazenamento em grande escala. Ainda assim, a meta atual é fortalecer o setor automotivo nacional, tornando o Brasil menos dependente de importações, além de mais inovador e preparado para o futuro sustentável. Ludmila Corrêa reforça que a tecnologia em desenvolvimento “é um passo importante para que o Brasil possa criar uma cadeia de produção de baterias mais moderna, segura e confiável, ampliando o domínio sobre algoritmos inteligentes de gestão de energia”. 

Ao final, todos os envolvidos compartilham a análise de que esse é apenas o começo de uma transformação mais ampla, que pode posicionar o Brasil como líder na produção de soluções do tipo. Como bem pontua o coordenador do projeto, “estamos construindo uma base sólida que permitirá ao país avançar significativamente na inovação em energia e transporte, promovendo um futuro mais sustentável, eficiente e independente”, finaliza o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e coordenador-geral do projeto, Alain Potts. 

Sobre a Linha V – Biocombustíveis, Segurança Veicular e Propulsão Alternativa à Combustão

A Linha V – Biocombustíveis, Segurança Veicular e Propulsão Alternativa à Combustão, do programa Mover, tem como diretriz a eletrificação do powertrain veicular para a alta eficiência energética, a utilização de biocombustíveis para a geração de energia e a adequação do contexto brasileiro de infraestrutura de abastecimento. 

A partir da aliança entre os principais atores que concentram o conhecimento do setor (empresas, entidades representativas e Instituições de Ciência e Tecnologia – ICTs), serão habilitadas as competências necessárias para capacitar a cadeia automotiva.

Liderada pela Fundep, a Linha V tem coordenação técnica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), do Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana (FEI) e da Universidade Estadual do Ceará (UECE).

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